terça-feira, 28 de julho de 2009

Tecnopolítica, Planejamento e Universidade

A Superintendência de Arquitetura, Engenharia e Patrimônio da UFF (SAEP) realizou um seminário interno no dia 28 de julho de 2009 no Auditório do Instituto de Geociências, para debater a sua ação no âmbito do programa de expansão e reestruturação da universidade bem como discutir formas e mecanismos de relacionamento com a recém-contratada empresa que deverá prover assessoria na fiscalização de obras e serviços de engenharia na Universidade.
A SAEP é um bom exemplo de um órgão operacional da UFF que está tendo coragem de se reestruturar e enfrentar o desafio que lhe foi proposto a partir de um programa de expansão sem precedentes na história da universidade. Se os longos anos de vacas magras que atravessou a universidade pública brasileira comprometeram seriamente as políticas acadêmicas, foi nos órgãos operacionais que o comprometimento atingiu sua intensidade mais perversa. Dentre estes se destaca o órgão técnico de engenharia e arquitetura, as chamadas prefeituras dos campi.
Com orçamentos que mal cobriam seu custeio, as universidades não construíam um metro quadrado de obra desde a última expansão do Acordo MEC/BID nos anos 80 e, portanto seus órgãos de engenharia não praticavam nem engenharia, nem gestão de engenharia. Se aliarmos a isso a falta de concursos, a falta de capacitação e os níveis salariais precaríssimos, podemos imaginar o estrago que os adoradores neo-liberais do “estado mínimo” produziram também aqui, na universidade pública brasileira.
Pois bem, apesar disso a nossa SAEP aceitou o desafio! E o seminário interno refletia claramente sua disposição de superar as dificuldades. Na programação, além de convidarem representante da Universidade Federal do ABC (UFBAC), que vive experiência recente de construção de aproximadamente 100 mil metros quadrados, partindo praticamente do nada por se tratar de uma universidade nova, me convidaram também, na condição de presidente da Comissão Mista de Orçamento e Metas, para falar sobre a articulação entre o plano de expansão e reestruturação e o plano de desenvolvimento institucional (PDI) da universidade.
O PDI da UFF, apesar dos seus poucos anos de vida (sua primeira versão cobria o período 2003-2007 e a segunda cobre o período 2008-2012), é uma experiência bem sucedida de planejamento institucional da universidade. Diríamos mesmo que a sua existência não apenas cria condições para consolidação de um caldo de cultura pró-planejamento na instituição, mas o faz de forma participativa, transparente e democrática através da Comissão Mista de Orçamento e Metas.
A elaboração da versão 2008-2012 iniciou-se com audiências públicas realizadas em 2007 em todos os campi da universidade, tanto em Niterói quanto no interior. As demandas da comunidade foram sistematizadas no documento final que foi aprovado em sessão extraordinária do Conselho Universitário de 06 de maio de 2009. Esta versão, que está publicada na íntegra no site do PDI (www.pdi.uff.br), resgata os princípios e as diretrizes fundamentais do documento anterior, preserva o seu eixo central, que era “expansão de vagas e melhoria qualitativa dos cursos” e incorpora o plano de reestruturação e expansão aprovado anteriormente pela universidade.
Apesar disso, a perspectiva de construção de planejamento participativo na UFF não está isenta de riscos. Para Carlos Matus, ex-ministro do planejamento de Salvador Allende no Chile, e criador da metodologia do planejamento estratégico situacional que inspirou a criação da Comissão Mista como uma “sala de situações”, o planejamento “é o cálculo que precede e preside a ação”. O vínculo entre o cálculo que precede e o cálculo que preside é a informação correta e transparente. Se esta não existe, a resultante é um planejamento formal que apenas serve para atender às exigências burocráticas mas que não é capaz de transformar a instituição.
Este é o primeiro grande desafio para o planejamento participativo na UFF: a falta de transparência. Apenas a título de exemplo, podemos citar a publicação no Diário Oficial no. 137 de 21 de julho de 2009, na Seção 3, de um extrato de dispensa de licitação transferindo para a Fundação Euclides da Cunha o valor de R$ 755.118,00 para fins de “apoio e gerenciamento do Projeto Desenvolvimento das Ações Estratégicas e Operacionais Execução do Plano de Expansão e Reestruturação – PDI” que no entanto não é do conhecimento da Comissão Mista, responsável tanto pelo PDI quanto pelo Plano de Expansão e Reestruturação.
Outro risco que pode ameaçar o planejamento participativo da universidade diz respeito às imbricações tecnopolíticas. Órgãos de engenharia e arquitetura, pela sua importância na intervenção e execução concreta dos investimentos públicos, sempre foram objeto de assédio de governantes, gestores e políticos pouco afetos à democracia como método de alocação ótima de recursos. É a chamada “lógica da execução”, uma forcinha aqui outra ali, de modo que ande melhor e mais rápido as obras dos aliados. Ocorre que esta prática acaba com a confiança institucional no planejamento, denigre o esforço profissional do órgão técnico e predispõe a comunidade para a descrença na eficiência da gestão pública. Sua constatação é difícil e o antídoto é o apoio institucional transparente a estes órgãos técnicos na proteção e preservação da sua integridade tecnopolítica.
É por essa razão que o seminário realizado pela SAEP deve ser merecedor dos aplausos, da atenção e do acompanhamento de todos os que acreditam que é possível e absolutamente necessário que a universidade pública seja transparente, democrática e eficiente e que técnica, cultura e política não são separadas, influenciando-se e determinando-se umas às outras.

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